No dia 14, próxima terça-feira, será realizado o Terças na Sociedade, com o tema: “Ética, Psicanálise e Responsabilidade Social”. Saiba mais e participe conosco:

Ética, Psicanálise e Responsabilidade Social

Luciana Marchetti Torrano – Membro Associado da SBPRP

No próximo Semeando a Psicanálise, em 14 de agosto, conversaremos sobre o tema: Ética, Psicanálise e Responsabilidade Social, um assunto atemporal, que merece reflexão, pois tanto a ética como a responsabilidade social transformam-se com a prática e com o reflexo dos novos conhecimentos e descobertas, tanto da psicanálise, como das outras ciências.

Vou dividir minha fala em três níveis: o nível interpessoal e transferencial – que se refere à esfera da clínica psicanalítica; o nível da formação psicanalítica – que se refere à ética psicanalítica entre seus pares e sobre a transmissão da disciplina; e a Responsabilidade Social da Psicanálise frente à Sociedade e à Cultura – que implica o psicanalista e seu olhar para intervir em esferas sociais.

Freud criou a disciplina psicanalítica como uma práxis. Inicialmente ele compreendeu que existia um desejo inconsciente que era alheio à vontade do homem, e os conflitos inconscientes levam a sofrimentos e perdas que a Psicanálise desde Freud se propôs a conhecer e tratar. O psicanalista em seu consultório deve manejar seus desejos e os desejos de seu paciente para que a análise aconteça. Neste contexto transferencial, muitos impasses surgem e levam o psicanalista a questionar suas atitudes e transformar em palavras e em conhecimento o que é vivido pela dupla.

Não obstante, devemos ampliar nossos horizontes para o fato de que o psicanalista é um ser humano que vive e faz parte de um Grupo ou Sociedade de pares, nas esferas municipal, estadual, nacional (FEBRAPSI)[1], continental (FEPAL) e, por fim, mundial (IPA). As instâncias psicanalíticas se propõem a divulgar a psicanálise, difundi-la, cuidar de seus rumos do ponto de vista científico e também repensar a prática psicanalítica nos consultórios. No entanto, a função da psicanálise não se limita aos divãs. A psicanálise também tem a responsabilidade social de intervir nas esferas familiares, políticas, educacionais, hospitalares etc…

O psicanalista também precisa da psicanálise para se formar, pois a psicanálise não se aprende nos bancos das Universidades, formar-se psicanalista depende de psicanalistas que cuidem eticamente das instituições psicanalíticas e cuidem de seus pares. Assim existe desde o início da história da psicanálise uma Psicanálise intramuros extramuros.

Historicamente, Freud criou a psicanálise também para as esferas sociais, segundo podemos constatar em suas palavras pronunciadas no Quinto Congresso Psicanalítico Internacional de Budapeste, em 1918, e depois publicadas no texto “Caminhos da terapia psicanalítica”.

“É muito provável que a aplicação em larga escala da nossa terapia nos force a fundir o ouro puro da análise livre com o cobre da sugestão direta… Mas, como quer que se configure essa psicoterapia para o povo, quaisquer que sejam os elementos que a componham, suas partes mais eficientes e mais importantes continuarão a ser aquelas tomadas da psicanálise rigorosa e não tendenciosa” (Freud, 1919[1918], p. 181)

Com o intuito de maior engajamento das instituições psicanalíticas no âmbito da Responsabilidade Social, em 2002, estando Otto Kernberger então presidente da IPA, apresentou uma proposta de um comitê da IPA que cuidasse do – “outreach” – das instituições psicanalíticas aos desafios da sociedade contemporânea. Muitas Sociedades passaram a desenvolver programas para uma expansão “extramuros” da psicanálise. Como já ocorre há mais de 20 anos na SBPRP. Com a mesma preocupação em 2015, no Congresso da Febrapsi em São Paulo, a responsabilidade social foi debatida na reunião plenária internacional, com o tema Engajamento do psicanalista no social, Stefano Bolognini, então presidente da IPA, destacou o fato de que:

“A psicanálise já exerce uma função social graças ao processo de transformação pessoal dos pacientes. Esse processo afeta também a cultura, a “mentalidade”, os padrões de relações interpessoais e o ambiente global das comunidades humanas. Sobretudo na cultura atual, com o excesso alienante das tecnologias e da informatização, que traz o risco de desconexão do contato do sujeito consigo mesmo (self) e com os outros, a psicanálise tem a possibilidade de promover a recuperação de elementos de humanidade que têm sido perdidos“ (Mattos, 2016).

O pensamento psicanalítico e sua prática já ganharam lugar de prestígio por sua função na saúde mental, depois na saúde geral com o conhecimento das doenças psicossomáticas, a psicanálise extramuros pode oferecer cuidados em âmbitos sociais que estão adoecidos oferecendo conhecimento e transformação.

Bolognini, S. (2015). La función social delpsicoanálisis. Palestra pronunciada em sessão plenária internacional com o tema “Engajamento do psicanalista no social” – Congresso Febrapsi São Paulo. (Tradução do texto em espanhol pelas autoras)

Freud, S. (1996). Linhas de progresso na terapia psicanalítica. In S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (J. Salomão, trad., Vol. 17, pp. 173-181). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1919[1918] )

Mattos, Ligia Todescan Lessa et al. O conceito de responsabilidade social: uma experiência na Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo. J. psicanal. [online]. 2016, vol.49, n.91 [citado2018-07-10], pp. 77-89 . Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-58352016000200008&lng=pt&nrm=iso&gt;. ISSN 0103-5835.

[1] FEBRAPSI – Federação Brasileira de Psicanálise Congrega as sociedades psicanalíticas brasileiras filiadas à Associação Psicanalítica Internacional (IPA), organiza e fortalece suas atividades de divulgação, difusão e ensino da psicanálise em nosso território, assim como a participação na Federação Psicanalítica da América Latina (FEPAL).