No dia 28 de setembro será realizado o Cinema e Psicanálise em São Sebastião do Paraíso. Débora Agel Mellen, membro associado da SBPRP, irá comentar o filme “Whiplash”. A entrada é gratuita e terá emissão de certificados.
Saiba mais:
Whiplash
Débora Agel Mellem
Seria uma insensatez criar um filme que apresenta uma relação professor-aluno, repleta de rigidez e narcisismo, inserida num contexto musical e ainda banhada a jazz, que prima pelo improviso? Ou seria um paradoxo a combinação entre a violência da super exigência e a liberdade expressa no jazz?
Infelizmente esse filme tem um caráter autobiográfico, o diretor Damien Chazelle era baterista e vivenciou uma relação traumática com um professor mega exigente. No filme, Andrew Neiman (Miles Teller), um jovem baterista de jazz, depara-se com o professor Terence Fletcher (J.K. Simmons), que exige desempenhos perfeitos de seus alunos. O andamento da música deve ser exato e qualquer desafinação é inadmissível. Usa métodos violentos, acreditando que deste modo formaria um músico genial como Charlie Parker. Que equívoco! Nenhum ser humano desenvolve-se numa atmosfera de cobrança humilhante. Mas Andrew submetia-se ao maltrato, para ser o escolhido de Fletcher. Era escravo da necessidade de ser aceito e também de seus próprios ideais. Tinha ódio de ser simplesmente humano, faltavam-lhe confiança e uma agressividade protetora. Com uma história sofrida de abandono materno, contava com seu pai, cuja relação amorosa amplia-se no decorrer do filme, dando-lhe sustentação para transformar suas atitudes frente à vida.
A sua criatividade lhe salvou! E o impulso em direção ao crescimento predominou, “deu o sangue” para se expandir. Sua relação com a música, o jazz, a bateria era vital e visceral. Este seu interesse não existia por acaso. O jazz nasceu do canto de dor dos escravos que vieram para a América do Norte. E entrelaçou-se com o blues, um lamento e um anseio de libertação dos negros, que se expressavam através das blue notes, do swing e da improvisação. Surge como uma dança, incluindo também a alegria.
Permitindo-me sonhar, o jazz pode ser uma expressão criativa da vivência de falta, que habita em todos nós. Podemos pensar na improvisação que ocorre na vida e também no setting de uma sessão de análise. E refletir sobre a base emocional que precisamos construir, para alcançarmos um viver criativo.
Este filme, além de conquistar o coração dos apaixonados por jazz, mostra uma estória de libertação de relações destrutivas, na qual a criatividade humana compõe novas formas do viver. Andrew segue um caminho doloroso até ser capaz de improvisar, no palco e na vida. Ouviu o ritmo das batidas de seu coração e se apropriou de quem ele era. O final do enredo é surpreendente, e o som que ele faz é maravilhoso! Ele se entrega ao presente, está vivo, existe, é um baterista talentoso!
Whip é chicote, whiplash é algo que se assemelha ao ruído de uma chicotada. Criar na música e na vida é transformar uma chicotada em som.
Deixe um comentário