CONSIDERAÇÕES SOBRE “O HOMEM DA AREIA”, DE E.T.A. HOFFMANN (1776-1822)

por Valter Donizete Flauzino 

Resumo: leitura de O Homem da Areia (Hoffmann) com enfoque sobre o poder que palavras e histórias têm de se transformar em imagens impressivas na imaginação e na mente das pessoas. Considerações acerca da permanência dessas imagens e dos efeitos emocionais decorrentes dessa situação.

“A impressionante novela Der Sandmann, publicada em 1817, e aqui apresentada sob o título O Homem da Areia, na exemplar tradução de Ary Quintella, dá bem a ideia das principais características de Hoffmann: seu senso do grotesco, do mórbido, do fantástico, do sobrenatural – e sua extraordinária intuição ao penetrar nos domínios do subconsciente, como verdadeiro precursor das explorações da moderna psicologia.”

Fernando Sabino, 1986

 O Homem da areia” é um conto estruturado em duas partes distintas, as cartas e um relato em 3a pessoa.

A parte epistolar, a primeira, compõe-se de três cartas: de Natanael para Lothar; de Clara para Natanael; de Natanael para Lothar. Hoffmann, para apresentar a fábula de sua narrativa, recorre a diferentes pontos de vista, o que se constitui por meio de relatos subjetivos, impregnados de impressões, percepções e sensações. No princípio da leitura, está-se à mercê do relato de fatos a partir de olhares subjetivos.

A primeira carta, de Natanael para Lothar, é uma justificativa pela ausência de notícias. Natanael é um estudante, que vive sozinho, na cidade de G., onde faz um curso de Física e um de seus professores é o italiano Spalanzani. Há tempos não escreve para a mãe nem para a noiva Clara. Depreende-se dessa carta que Lothar escrevera ao amigo, pedindo notícias. O narrador reconhece a preocupação que deve ter causado à mãe, à amada Clara e ao amigo. Como forma de se penitenciar, faz, em carta, uma confidência ao amigo. É relevante notar que Natanael não escreve para a mãe nem para a noiva Clara: prefere fazer a confidência sobre uma situação perturbadora ao amigo.

O rapaz justifica a demora em mandar notícias como decorrência de terríveis pressentimentos e tormentos que vive. Para Natanael, a vida futura seria atingida por terríveis e fatais acontecimentos. Esse presságio funesto o impediu de escrever. Como falar à mãe e à noiva sobre esses temores? Para preocupá-las? Assustá-las?

Natanael afirma que os tais terrores começaram a partir de uma visita inesperada, “no dia 30 de outubro, ao meio-dia”. Um vendedor de barômetros, por nome Giovanni Coppola, esteve em sua casa e  ele o expulsou: “Além de não ter comprado nada, ameacei jogá-lo pelas escadas abaixo, no que partiu bem depressa.” A razão para a atitude intempestiva e agressiva do estudante é que este, ao ver o vendedor até então desconhecido, reconheceu nele o advogado Coppelius, amigo de seu pai, frequentador da casa da família, mas que oprimia e aterrorizava as crianças.

Para Natanael, a visita de tal vendedor, o Coppelius do passado, era indício de que tudo de mal iria sobrevir. Esse pensamento converte-se em certeza e tem, sobre o estudante, força avassaladora, a ponto de impedi-lo até de dar notícias à família. O rapaz passa a viver em permanente estado de pavor.

Para fundamentar seus temores, o jovem relata uma história da infância (admite que Clara e Lothar vão rir, debochar dele): o pai era homem recluso em casa, vivia no escritório, com exceção da hora das refeições. Às noites, a mãe levava os filhos ao escritório para ficarem em companhia do pai. Este lhes contava histórias maravilhosas ou lhes dava livros ilustrados. Era um estímulo à imaginação dos filhos. Por volta das nove horas, a mãe chamava os filhos para dormir, dizia que o Homem da Areia estava chegando, ela já podia ouvir os passos. O garoto Natanael ficou impressionado e também ouviu os passos de tal homem. Na verdade, era o advogado Copellius, que vinha tratar de negócios com o pai. A história se repete e, na imaginação do menino, o Homem da Areia era um monstro apavorante.

O garoto pede explicações à mãe, que lhe informa que não há Homem da Areia algum, é apenas uma maneira de dizer que as crianças estão com sono, há areia nos olhos. A explicação não satisfaz o menino nem alivia seu terror.

Para agravar ainda mais a situação, uma velha governanta da casa, inquirida sobre o Homem da Areia, diz que este era um homem muito mal que procurava crianças que não queriam ir para a cama. Atirava areia nos olhos delas, os quais caíam, ele os pegava e os levava para a lua a fim de alimentar seus netinhos, seres semelhantes a corujas. Esses bicavam os olhos das crianças que não eram boazinhas. Natanael acolheu essa versão como verdade pavorosa e passou a temer imensamente o Homem da Areia, que visitava seu pai.

A história da governanta esclareceu muitos aspectos da história da mãe: agora, Natanael sabia de toda a verdade. As irmãs dele que também ouviram a primeira versão parece não terem sido atingidas, mas, no menino, esse relato encontrou terreno fértil para crescer e se transformar em terror absoluto: “Desde então, a imagem do Homem da Areia ficou gravada em meu espírito com cores atrozes.”

À noite, ao ouvir passos, o garoto entrava em pânico, começava a gritar e se refugiava no quarto. Os passos eram do advogado Coppelius, que visitava o pai. Com o tempo, Natanael aprendeu que não existia o “Homem da Areia” nem seus netinhos na lua. Tudo era apenas uma história fantasiosa. O narrador diz, apesar disso,:” […] continuei apavorado, com horror e repugnância, cada vez que escutava seus passos subindo os degraus até o gabinete de papai e o bater violento da porta se fechando.”

É preciso considerar que, mesmo sabendo que a história é fantasia, Natanael se apavora com a chegada do “Homem da Areia”: quem chega a casa é o advogado Coppelius. Este homem, às vezes, jantava com a família. Parecia não gostar de crianças e as assustava. Nenhuma criança na casa tinha estima pelo amigo do pai. O estudante o descreve como figura aterrorizante, de “mãos nodosas, peludas”, que causavam nojo às crianças. O advogado, ao perceber isso, divertia-se tocando a comida delas, o que as fazia abandonar o prato, independente da iguaria servida.

Uma noite, o garoto se escondeu no escritório do pai e descobriu que a visita “misteriosa” era Coppelius e, assim, concluiu que Coppelius era o Homem da Areia. Ao vê-lo, entendeu que tal figura não era o espantalho da história da governanta, era muito pior: “Era um monstro fantástico, odiento, e que, por onde passava, levava a tristeza, a tormenta, a perdição neste mundo e no outro.”

Nessa noite, Coppelius determinou que ele e o pai colocassem mãos à obra. Os dois se dedicavam à prática da alquimia, o que Natanael não compreende. Vê-os com roupas estranhas, objetos estranhos, um fogareiro, uma chama azul. Enquanto Coppelius se entusiasma com o trabalho, segundo Natanael, grita “com voz surda, ameaçadora”: “Olhos! Dê-me olhos!”

Aqui, é possível ter dimensão do poder aterrador do Homem da Areia sobre o estudante. O que ele vê e relata é um intervalo entre o real (os dois homens, no escritório, envolvidos em uma atividade) e o irreal (Coppelius tem falas que o Homem da Areia teria. É a personagem má da história da governanta que desejava olhos para alimentar os netos na lua, não o advogado, até porque não há referências a familiares deste).

O pavor do garoto é tamanho que ele grita e é descoberto em seu esconderijo. O advogado o chama de “pequena besta” e afirma que, no momento, teria olhos! Natanael ouve o pai suplicar ao “monstro” que deixe os olhos do filho. O advogado ri e concorda, mas insiste em observar o mecanismo das mãos e dos pés e começa a estalar as articulações do garoto. O terror é enorme, e Natanael desmaia.

O estudante relata que, ao voltar a si, era cuidado pela mãe, que lhe informou que o Homem da Areia já tinha ido embora e que não mais o machucaria. Esse relato é apresentado como fato. O garoto passou dias com febre, doente, na cama. Ao se recuperar, pergunta sobre o Homem da Areia. No período entre o desmaio no escritório e o recuperar da consciência já em seu quarto, há apenas uma preocupação: o Homem da Areia. Após isso, fica doente, tomado por febre por semanas e, ao se recuperar, a primeira fala diz respeito ao Homem da Areia. Essa figura, personificada em Coppelius, estava impressa na mente do garoto e se mantém impressa na memória do jovem Natanael.

Depois de algum tempo sem notícias, uma noite, Coppelius retorna à casa dos pais do garoto. Este observa que a mãe ficava insatisfeita com a presença do advogado. É como se a mãe entendesse o mal que este homem representava. Não se pode esquecer de que essa mãe disse ao filho que não existia nenhum Homem da Areia. Dessa forma, pode-se perguntar: que história Natanael conta, em carta para Lothar? O que é real em tudo isso? O que é fruto de sua imaginação apavorada por um caso fantasioso e banal? Por que essa história encontra ressonância em Natanael?

O estudante relata a última visita de Coppelius, um ano depois. A mãe se mostrou contrariada, e o pai prometeu que seria a última vez. O garoto ficou petrificado de medo, e a mãe o conduziu ao quarto para dormir. É curioso que, em momento algum, ele não faça referência às reações das irmãs. A figura de Coppelius/Homem da Areia assombrava o garoto, mas era indiferente às meninas?

A experiência dessa noite resultou em explosão, fogo e na morte do pai de Natanael. Este acordou, à meia-noite, com um estrondo, e gritou imediatamente que era Coppelius. Este fugiu na noite e desapareceu. Ao ver o pai morto, a mãe desmaiada, o garoto grita: “Coppelius! Satanás amaldiçoado! Você matou meu pai!” Ele chora até desmaiar. No relato, não é a primeira vez que, sob forte pressão, Natanael perde os sentidos.

Ele encerra a carta, afirmando a Lothar que o vendedor de barômetros, que ele dispensou, quase atirando-o pela escada, era Coppelius! Insiste que a aparição desse homem só pode ser interpretada como “presságio de acontecimentos funestos.” Além disso, afirma ao amigo que está disposto a enfrentar Coppelius e vingar a morte do pai. Como Natanael poderá fazer isso, se não é capaz de ficar diante do advogado sem entrar em pânico e perder os sentidos? Que Coppelius o rapaz pretende enfrentar? O que desapareceu há anos ou o que existe em sua imaginação?

Ao se despedir de Lothar, ele se compromete a escrever para a “doce, querida Clara”, quando estiver mais calmo.

A seguir, o leitor é surpreendido, pois a próxima carta é de Clara para Natanael. O estudante, por um lapso, uma distração, um ato falho, em vez de endereçar a carta ao amigo, fê-lo à Clara. Toda a carta foi lida por Clara, antes de Lothar.

A moça escreve ao estudante e confessa a atitude pouco ética de ler uma carta que não era para ela, embora o envelope trouxesse seu nome. Clara justifica a atitude, afirmando que ficou muito preocupada com a situação de Natanael, supôs que o acontecimento terrível a que ele se referira fosse a separação entre eles. Ao se dar conta dos medos e tormentos do namorado, passa a agir de forma sensata, esclarecedora, segura de si, racional, até com certa onipotência. Dessa perspectiva, Clara desconstrói todos os temores e terrores do amado.

A moça dá explicações para os fatos relatados na carta e apresenta argumentos que revelam que os medos de Natanael provêm da imaginação, da mente dele. Ela afirma que o tormento e a potência pérfida, sinistra e hostil estão em nós mesmos. Se essas forças existem, elas teriam de se desenvolver dentro de nós mesmos, “enquanto nós evoluímos.” “Essa potência teria de ocupar o nosso eu.” Dessa forma, haveria crença nela e espaço para que ela cumprisse sua missão de fazer o mal.

Para Clara, o mal que Coppelius e Coppola, que são pessoas distintas e ocupadas com suas vidas, podem fazer a Natanael está na mente do rapaz. Clara lhe pede: “Readquira, eu lhe peço, a serenidade!”. Nenhum dos casos relatados por Natanael mereceu a credibilidade de Clara. Ela comenta que discutiu a questão com o irmão Lothar.

A seguir, o leitor se depara com a 3a carta – de Natanael para Lothar -, na qual o estudante se confessa aborrecido pelo fato de Clara ter lido sua carta, embora reconheça que, por distração, tenha-a endereçado a ela. O rapaz refere-se à carta de Clara como espaço de “filosofia abstrusa”. As considerações da moça foram rechaçadas por ele. O rapaz refere-se ao professor Spalanzani e à filha deste, Olímpia, moça de grande beleza, mas que vive escondida de todos. Natanael a viu pela janela, já que, coincidentemente, é vizinho do professor universitário. Encerra a carta com a notícia de que em breve retornará à cidade natal e reencontrará a mãe, Clara, Lothar e os demais amigos.

Com o fim dessa carta, inicia-se – o que se pode considerar – a segunda parte da narrativa. O relato passa a ser apresentado por um narrador em 3a pessoa, com onisciência, que afirma que “seria impossível inventar algo mais estranho e mais surpreendente do que o sucedido” com seu amigo Natanael. As primeiras palavras do narrador sugerem que a realidade (da ficção de Natanael) causa mais estranheza e surpresa do que qualquer invenção mirabolante.

O narrador se apresenta como amigo de Natanael, alguém que acompanhou de perto a trajetória do estudante a quem ele denomina “pobre amigo”. Ele se diz um retratista e se refere a Lothar como um amigo. Ele é alguém próximo a Natanael, mas que não foi mencionado em momento algum pelo estudante em suas cartas.

Antes de iniciar o relato, o narrador se esforça para conquistar a simpatia do leitor para o caso de Natanael, ao pedir que aquele se coloque no lugar deste, a fim de perceber a solidão provocada pelo fato de se sentir atormentado e perseguido por medos e forças que não são visíveis nem compreensíveis por ninguém: “Seu olhar estranho parecia querer apreender no espaço vazio formas invisíveis a todos os outros olhos e suas palavras se extinguiam em suspiros inquietantes.”

Essa postura do narrador, sensível ao conflito de Natanael, é mais generosa do que a de Clara ou Lothar, já que estes, para ajudá-lo, tentavam dissuadi-lo de suas ideias fixas, negando seus pavores. Clara e Lothar não acolheram Natanael, não o ouviram; em vez disso, analisaram os fatos e chegaram a um veredito: tudo era fruto da mente dele. Clara, inclusive, deixava-o só quando ele começava a falar de seus temores, recusava-se a ouvir a leitura dos textos que ele escrevia, dando vazão às fantasias e medos. O narrador quer a empatia dos leitores para o sofrimento de Natanael. Isso leva a uma pergunta: quem é esse narrador que se preocupa tanto com Natanael, se não foi mencionado antes?

Ele afirma que teve “o desejo furioso de contar o destino fatal de Natanael”. Revela a preocupação de preparar os leitores para a história “singular e maravilhosa” do estudante. Dessa forma, passa a discutir perspectivas metalinguísticas para o relato da história de Natanael. Pensa em emular um conto de fada, em adotar uma história linear, mas opta por contar com a ação em pleno andamento. Ao fazer isso, percebe que, no relato da cena em que Natanael expulsa o vendedor de barômetros Coppola, havia um olhar cômico no rapaz, então, desistiu de começar a história. Pede ao leitor que considere as três cartas, já comentadas, como o início da narrativa.

Antes de dar sequência aos fatos, o narrador se preocupa em explicar as origens das relações afetivas entre Natanael, Clara e Lothar: após a morte do pai de Natanael, a mãe do rapaz acolheu os filhos órfãos de um parente distante, Clara e Lothar. Desde o início, Clara e Natanael sentiram forte atração e se tornaram noivos, sem quem ninguém objetasse. Natanael abandonou a cidade natal para estudar em G. com o professor Spalanzani.

Mais uma vez, o narrador adia o relato, pois confessa se sentir tomado pela imagem de Clara e passa a descrevê-la, afirmando que os padrões de beleza dos artistas tradicionais são insuficientes para captar a beleza da moça. Para ele, Clara tinha “a imaginação de uma criança alegre, singela, pura”; ao mesmo tempo, “a alma profunda, terna, de mulher; a inteligência límpida e muito discernimento”. Essa condição mental de Clara – pode-se notar – inviabilizava a convivência com Natanael, devido ao comportamento estranho do estudante, e com todos aqueles que não priorizassem a vida real. A moça era considerada “fria, insensível e prosaica“, por adotar uma postura racional, tal como demonstrou na carta que escreveu ao noivo.

Ao retornar à cidade natal, Clara e Natanael passam a viver dias de paz e tranquilidade, mas o rapaz se entregava a longos momentos de meditação e solidão, pois “o repugnante mercador de barômetros havia-se introduzido em sua vida como poder hostil.”

O jovem passa a pensar que forças superiores comandam os atos humanos, afirma que “é loucura acreditarmos que a criação – nas artes e nas ciências – seja ato livre da vontade, pois o entusiasmo necessário para criar não parte de nós, sendo desencadeado pela ação de algum princípio superior, externo a nós.” Esse tipo de pensamento evolui para a exaltação mística, o que repugnava Clara. Ele passa a afirmar que Coppelius era o princípio do mal e se apoderara dele, ainda criança, naquela noite em que se escondera atrás da cortina no escritório do pai. Natanael tenta convencer Clara disso, o que causa conflitos entre eles.

Sentindo-se ignorado, incompreendido, Natanael se refugia na poesia. Escreve um poema acerca de seu futuro com Clara, impossibilitado pela presença maléfica de Coppelius. No dia do casamento deles, Coppelius surge e toca os olhos de Clara. Eles pulam fora e quicam no peito de Natanael. Coppelius segura Natanael e o joga numa roda de fogo, que girava como furacão. No ápice dessa cena, Clara lhe diz que Coppelius o enganou: ela estava com os olhos. Natanael a olha e, nos olhos dela, vê que a morte olha para ele calmamente. Na leitura do texto para a noiva, o desencontro entre eles é tamanho que o rapaz surta e grita com ela e a empurra, chamando-a de “Autômato maldito, sem vida!”

Essa situação causa uma tremenda discussão entre Natanael e Lothar, o que seria resolvido em um duelo: um dos dois morreria na manhã seguinte à discussão, apesar de toda a história afetiva deles. Na manhã seguinte, prontos para o duelo, são interrompidos por Clara, que afirma não poder viver após o duelo. Eles se arrependem e os três se abraçam, jurando jamais se separarem e viverem  com fidelidade e afeição constantes.

Após essa reconciliação, Natanael passa mais três dias em casa e tem a impressão de que tinha se libertado dos medos do passado, “ao resistir à potência sombria e carcerária” e salvado seu ser do aniquilamento. Ele retorna a G. para mais um ano de estudo. O incidente referente ao conflito entre os três e a Coppelius não foi comentado com a mãe de Natanael, pois ela, como o filho, julgava o advogado responsável pela morte do marido.

Quando retorna a G., é impedido de entrar em sua casa: um incêndio a destruíra, deixando apenas as paredes em pé. Amigos de Natanael entraram no quarto e salvaram os livros e manuscritos do rapaz. Levaram tudo para uma casa vizinha e alugaram um quarto para o estudante. O fogo começou no laboratório do boticário, que vivia no andar de baixo. Foi um acidente ou há algo de estranho, de mal, que circunda Natanael como ele supunha?

A nova residência do estudante fica em frente à casa de Spalanzani, o que dará ao rapaz a oportunidade de observar Olímpia, a bela e intrigante filha do professor, a qual ficava horas na mesma posição, sem fazer nada, estática. O estranho estava diante do estudante, mas ele não o enxergava.

Dedicava-se aos estudos e pensava em Clara. Decidiu escrever para a noiva, quando foi surpreendido pela visita de Coppola (O professor Spalanzani havia dito que o vendedor de barômetros era italiano como ele; Coppelius era alemão), o que o deixou assustado. Lembrou-se de Clara, controlou-se e disse não ter interesse em barômetros. Natanael se mostra equilibrado, mas Coppola lhe oferece “occhi”, “zoios lindos!”

Essa fala desestabiliza o estudante, que começa a gritar: “Você é maluco! Como é que pode ter olhos? Olhos? Olhos?”

Coppola despejou sobre a mesa uma infinidade de lunetas e óculos. Tem-se a impressão de que o vendedor não se dá conta das reações estranhas do rapaz e continua a expor os produtos. Natanael não consegue tirar os olhos da mesa, pois “milhares de olhos pareciam dardejar olhares reluzentes para ele”.

A palavra “olhos” é um gatilho para o estudante. Ela resgata, imediatamente, a história (ouvida na infância) acerca do Homem da Areia, que colecionava olhos. O medo infantil persiste no jovem, apesar de seus esforços em contê-lo, e o faz ler e ver o mundo por essa perspectiva.

A reação do rapaz, tomado pelo pavor, é agressiva: “Para, monstro!”, ao mesmo tempo em que segura o braço do vendedor, que se dispõe a vender-lhe binóculos. Natanael consegue se controlar e, para amenizar a situação, apanha uma luneta de bolso e decide experimentá-la. As lentes aproximavam os objetos com “tanta pureza, acuidade e perfeição.” Ficou impressionado. Sem querer, olhou para o quarto da casa vizinha e viu Olímpia, que estava na posição de sempre, estática. Ele a considerou muito bonita, apenas os olhos pareciam estranhamente fixos, mortos. Olhou-a fixamente pela luneta e “imaginou” que os olhos da moça tinham vida; deles, desprenderam “vaporosos clarões lunares”.

Pode-se pensar que a imaginação de Natanael (o “cérebro” como diz Clara) o faz ver o que não existe, acreditar no que vê, mesmo que isso não exista. Há, nele, dificuldade em distinguir o real e o irreal.

Coppola despertou o rapaz do encantamento, cobrando-lhe a luneta. Este pagou e, inquirido pelo vendedor, afirmou que a luneta era boa. Despediu-o com irritação. Coppola saiu rindo; Natanael supôs que tivesse sido logrado no preço. A seguir, voltou à carta para Clara, mas, antes, passou os olhos pelo quarto de Olímpia. Foi tomado por uma força irresistível que o levou a pegar a luneta e contemplar a “sedutora Olímpia”, até que um amigo, Siegmund, viesse chamá-lo para a aula.

Nos dias seguintes, Natanael não teve oportunidade de ver Olímpia, pois as cortinas e a janela foram cerradas. O desespero tomou conta do rapaz. Sem ver sua nova paixão, partiu para o campo. A imagem de Olímpia ia à frente, enquanto a imagem de Clara se esvanecia. Desde a luneta, Olímpia passou a ter um encanto avassalador sobre o rapaz.

De volta à cidade, soube que Spalanzani daria uma grande festa, metade da universidade havia sido convidada e, para espanto de todos, apresentaria a filha à sociedade. Natanael, ao entrar em casa, encontrou um convite e foi ao evento.

Em dado momento, Olímpia, com roupa cara e de bom gosto, apareceu. Natanael a vê e depara-se com rosto e corpo perfeitos. “A curiosa curva do dorso e a estreiteza da cintura de vespa deviam ser feitas por um espartilho muito apertado. O andar e sua atitude tinham qualquer coisa de compassado, de rígido que algumas pessoas julgavam desagradável, mas era explicada pela inibição que devia estar sentindo por causa da festa.” O comportamento estranho da moça é explicado por uma visão idealizada. Tudo o que em Olímpia é mecânico, artificial, pouco espontâneo, estranho… é fruto da timidez dela.

No decorrer da festa, Olímpia tocou piano e entoou uma canção patriótica. Fascinado, Natanael sacou a luneta para admirar a moça. Então, deu-se conta de que ela o olhava prostrada, amorosamente. Ele ficou encantado e, no final da apresentação, causou certo constrangimento, ao gritar: “Olímpia!” Todos se viraram para ele e houve quem risse da situação.

A luneta potencializa os olhos de Natanael e os torna mais cegos ainda para a realidade. O rapaz se apoia em agentes externos para dar vazão a conteúdos delirantes e fantasiosos, que são tomados como verdades incontestáveis.

Na sequência da festa, houve o baile. O rapaz decidiu que dançaria com a moça e o fez. Imaginava que ela seria muito disputada, mas Olímpia esteve disponível para ele o tempo todo. Natanael não consegue ver o que acontece em seu entorno. Nesse momento, tudo começa e termina em Olímpia.

Ao pegar a mão de Olímpia para dançar, sentiu-a fria como gelo e sentiu correr-lhe pelas veias “o frio terrível da morte.” Ao olhar para ela, viu que “amor e desejo” brilhavam nos olhos dela e, então, “imaginou” que as artérias dela começavam a pulsar e eram irrigadas por um torrente de sangue aquecida. Dançaram algumas vezes e, segundo o narrador, se o rapaz fosse capaz de ver algo além de Olímpia, teria brigado várias vezes em função de deboches, murmúrios e olhares irônicos.

Pode-se pensar que Natanael é uma ameaça a si mesmo, é seu mais terrível inimigo: quem pode destruí-lo, arrancar seus olhos e acabar com sua vida, não é Coppelius/Homem da Areia, é ele mesmo.

No decorrer do baile, o rapaz perdeu a timidez e falou longamente do amor que sentia pela bela moça; ao que ela respondia em pequenos suspiros: “Ah-ah-ah!” (as únicas palavras de Olímpia). Ele a julgava uma mulher sublime, celestial, exemplo de amor de outra vida, alma profunda, mas ela emitia apenas “Ah-ah-ah!”.

O encantamento do rapaz era tamanho que a festa acabou sem que ele se desse conta. Notou que tudo estava escuro. O professor Spalanzani havia passado uma ou duas vezes perto do “feliz casal”. Para acabar o encontro, Natanael pedia a Olímpia que confessasse seu amor, que dissesse que o amava; ao que ela respondia: “Ah-ah-ah!”. Olímpia se afasta e, antes de sair, o estudante ouve do professor: “Você teve uma conversa muito animada com minha filha. […] Se você tem prazer em conversar com essa bobinha, sua visita será sempre bem-venda.”

Aqui, há elementos para o estranhamento, até o terror, porque não se sabe se o professor foi cínico com Natanael ou se acredita mesmo no que falou. Tendo em vista quem Olímpia revelará ser, trata-se de uma fala, no mínimo, intrigante.

A festa de Spalanzani e a presença de Olímpia foram assuntos por vários dias. À moça, atribuíam beleza,  rigidez e estupidez. Talvez essas fossem as razões pelas quais o pai a mantinha escondida em casa.

Em conversa com Natanael, Siegmund pergunta-lhe como foi capaz de se apaixonar “por aquele rosto de cera, aquela boneca de madeira?” Isso quase provoca uma grande briga entre os amigos, mas Siegmund, percebendo o desequilíbrio do estudante, preferiu concordar com ele e reconhecer a beleza de Olímpia. Objetou, apenas, que ele não fosse o único a pensar em Olímpia como um ser estático, com “qualquer coisa de sinistro”. Ele e os amigos queriam ficar longe dela, pois tinham a impressão de que ela apenas fingia ser criatura viva.

Natanael retrucou que eram todos “homens prosaicos e frios”, aos quais Olímpia poderia parecer inquietante; ela se revelava a homens com “sensibilidades poéticas”, como ele. Admitia que ela falava pouco (a moça só dizia “Ah-ah-ah!”), “mas as suas raras palavras são como hieróglifos de um mundo interior, onde reinam o amor e o conhecimento sublime da vida espiritual, contemplando a eternidade.”

Siegmund, compadecido, expressa votos de que Deus guarde Natanael, mas o adverte de que estava no caminho errado.

Para Natanael, só havia Olímpia: a mãe, a noiva Clara e Lothar tinham desaparecido de sua memória. A realidade sucumbiu à irrealidade. O rapaz passava várias horas em companhia da “namorada” e lia seus poemas e narrativas para ela. Nunca teve tão magnífico ouvinte. Olímpia não desviava a atenção dele para bordar, tricotar, olhar para a janela, nunca ficava entediada. Ela apenas se manifestava quando o rapaz beijava-lhe a mão para ir embora: “Ah-ah-ah!” “Boa-noite, querido!”

Havia, no estudante, momentos de lucidez e, então, lembrava-se da estranheza de Olímpia, de seu mutismo, mas, tomado pela delírio, justificava a situação: “Que significam as palavras, as palavras! A expressão de seus olhos celestiais diz mais do que toda linguagem daqui de baixo. Como poderia uma filha do céu se acomodar aos estreitos limites traçados pelas miseráveis necessidades humanas?”

O professor Spalanzani parecia muito satisfeito com o namoro. Quando Natanael fez vagas referências ao casamento, recebeu sinais claros de aceitação. Motivado por essa reação do futuro sogro, o rapaz decidiu jantar, no dia seguinte, na casa de Olímpia, e suplicar-lhe que confessasse seu amor por ele, o que os olhos dela já tinham revelado há muito tempo. Há, aqui, exemplo de mais um delírio do estudante.

Natanael decidiu dar à noiva um anel que a mãe lhe dera. Ao procurá-lo, as cartas de Clara e Lothar caíram no chão, mas ele não as apanhou. Guardou o anel no bolso e foi para a casa do professor. As cartas são, aqui, sinais não percebidos por Natanael. Se apanhasse as cartas, pensasse em revisitá-las, talvez…

=Ao chegar ao patamar da escadaria, ouviu gritos, arrastar de pés, ruído de vidro partido, trancos e golpes contra a porta, que pareciam vir do gabinete de Spalanzani. A violenta discussão tratava da disputa por algo valioso, feito em parceria, e falavam em rolamentos, olhos… As vozes de Coppola e Spalanzani se entrecruzavam em fúria. O estudante correu para o gabinete e se deparou com uma cena apavorante.

Spalanzani e Coppola seguravam Olímpia, puxavam-na, disputavam-na aos berros. Essa cena remete à noite em que Natanael, ainda menino, escondeu-se atrás da cortina, no escritório do pai para descobrir quem era o Homem da Areia. Na ocasião, Coppelius e o pai teriam pegado o menino e esticado o corpo dele, pois o advogado queria observar as articulações do garoto. Coppola torce o corpo da boneca, arranca-a das mãos do professor e lhe dá um soco tremendo, derrubando-o. A seguir, joga o corpo nas costas e desce as escadas, “rindo seu riso horrível e estridente”. O manequim, a “celestial Olímpia”, vai batendo nos degraus.

Natanael fica imóvel, aterrorizado, pois havia visto o rosto de cera de Olímpia, sem olhos, apenas cavidades negras. Ferido e ainda no chão, Spalanzani lhe ordena:

– “Corre atrás dele, corre! Não fica aí parado. Coppelius roubou meu mais belo autômato.” Afirma ter trabalhado vinte anos no projeto e revela que os mecanismos, a linguagem, o andar, tudo era obra dele. Apenas os olhos haviam sido roubados. “Corre atrás dele, me traz Olímpia de volta. Olha aí os olhos dela!” São as últimas palavras do professor.

Natanael então viu dois olhos ensanguentados no soalho, que “olhavam para ele.” Spalanzani os jogou no peito do rapaz. O que Natanael está vivendo agora? Ele viu que Olímpia era uma boneca de madeira, como os boatos sugeriam. O professor que, antes, havia garantido ao jovem que Coppola era um negociante italiano, conhecido dele, chamou este vendedor de Coppelius! Então Coppelius e Coppola são a mesma pessoa? O rapaz olha a realidade e enxerga o delírio?

Ao sentir os olhos baterem em seu peito, a loucura se apossa de Natanael e ele vocifera: “Ha-ha-ha! Roda de fogo, roda de fogo, gira, gira, alegremente, alegremente. Opa! Boneca de madeira, opa, linda boneca de madeira!” Atira-se contra o professor com a intenção de estrangulá-lo e o teria feito se as pessoas não interviessem. O estudante surta e é levado para o hospício. As palavras de Natanael remetem ao poema que ele escreveu, relatando como Coppelius destruiu o casamento dele e Clara no dia do evento. De certa forma, Coppelius impediu o casamento dele com Olímpia.

O episódio de Olímpia, o autômato, a boneca de madeira, fez com que os rapazes começassem a olhar suas namoradas com desconfiança e esperar delas atitudes que revelassem imperfeição e humanidade. Essa passagem contém crítica aos costumes da época, os quais prezavam comportamentos segundo modelos e regras rígidos, o que parecia anular a espontaneidade da vida.

Natanael acorda um dia, já em casa, como se tivesse saído de um pesadelo e se depara com a mãe, Clara, Lothar e Siegmund, que não o abandonou em momento algum desde o surto de loucura.

“Todos os sinais de demência desapareceram.” Essa é fala do narrador, o que permite pensar que o rapaz está curado. Aos poucos, Natanael recobra as forças, fica mais calmo, readquire a inocência da infância e descobre o coração admirável de Clara. Novos tempos se anunciam para a família, pois a mãe de Natanael recebera uma herança de um tio velhinho, o que melhoraria as condições de vida de todos. Não se fazia qualquer referência ao passado. Apenas na despedida de Siegmund, Natanael observou que ia por um caminho ruim, mas que Clara o reconduziu à estrada do céu. Ela era um anjo na vida dele. Siegmund não permite que ele continue a falar.

Clara e Natanael caminham pelo centro da cidade, e ela sugere que subam o alto campanário da igreja para observar as montanhas distantes. A mãe do rapaz foi para casa, e Lothar se recusou a subir todos os degraus, preferindo esperá-los embaixo.

Lá no alto, os dois observavam os montes a distância. Clara pediu ao noivo que reparasse uma moita cinzenta, “engraçadinha, que parece avançar para nós”. Instintivamente, Natanael pegou a luneta que havia comprado de Coppola e apontou para o lugar indicado por Clara.

Natanael ainda guarda a luneta de Coppola. Não só o faz, como a carrega consigo. O que pensar disso? Ele ficou internado no hospício; depois, ficou em recuperação em casa, mas manteve a luneta ao alcance da mão.

No lugar da moita, Natanael vê Clara, a noiva. A moça que estava ao lado dele aparece enquadrada pelas lentes da luneta. Ele fica pálido, uma convulsão contrai artérias e veias. A imagem de Clara se transforma em torrentes de fogo. O pavor toma conta dele. Ruge como um animal acuado, salta no ar, grita e ri de forma ameaçadora:

“- Boneca de madeira, gira, gira! Boneca de madeira, gira!”

Natanael agarra Clara com violência para jogá-la do alto do campanário. A loucura o domina por completo. Clara grita por socorro em desespero. Lothar, ao ouvir os gritos da irmã, sobe as escadas correndo, resgata Clara e dá um soco em Natanael. Desce as escadas correndo com a irmã nos braços. No campanário, Natanael corre de um lado para o outro, aos pulos, gritando: “Roda de fogo, gira, gira! Roda de fogo, gira!” Essas palavras (gritadas), e as imagens que povoam a mente de Natanael se assemelham ao poema que ele compôs e à cena que se passou em casa de Spalanzani, quando o estudante foi tomado pela loucura.

Muitas pessoas se juntaram embaixo para assistir ao desfecho. Entre elas, estava o advogado Coppelius, que acabara de chegar. Alguns se dispuseram a subir e capturar o louco. O advogado sugeriu que esperassem o rapaz descer sozinho. Como os demais, ficou a olhar para cima.

De repente, Natanael olha e para, congelado, ao ver, lá embaixo, Coppelius. Dá gritos agudos: “Ah! Ochhi belli! Occhi belli!” e salta por cima da balaustrada. Natanael cai no pavimento, a cabeça arrebentada; Coppelius some na multidão.

Muitos anos depois, segundo o narrador, Clara foi vista numa região distante, ao lado de um homem de boa aparência. Parecia serena, segura e feliz. Ao lado do casal, dois meninos brincavam. O narrador conclui que Clara encontrou a felicidade que convinha a seu caráter benigno e gosto pela vida. Isso ela jamais teria ao lado de Natanael, jovem de “alma dilacerada”.

Esse desfecho revela que Natanael estava certo? Na carta que escreveu a Lothar, previu que Coppelius destruiria sua felicidade e sua vida com Clara… Uma parte desse presságio se confirmou. A vida de Natanael acabou, mas as ações foram tomadas por ele. Independente de quem seja Coppelius/Coppola/Homem da Areia, foi o estudante quem se atirou do alto do campanário. O relato do narrador em 3a pessoa mostra que o rapaz era louco e foi essa doença que o levou a destruir todas as possibilidades de vida feliz e o conduziu ao suicídio.

Há situações que provocam dúvidas: Coppola e Coppelius eram a mesma pessoa? Como entender que o professor Spalanzani garantisse que Coppola era italiano como ele? Era mentira de Spalanzani? Por que um professor universitário mentiria? Essa questão é relevante, porque, logo após o confronto entre o professor e o vendedor de barômetros, Spalanzani, tomado de fúria, disse que Coppelius o havia roubado! Tudo o que se passou com Natanael foi uma trama diabólica? Por que Natanael? Qual o interesse?

Pode-se pensar que não foi trama alguma, mas que as palavras e os acontecimentos encontraram em Natanael terreno fértil para germinar, crescer e tomar a mente, a imaginação, as emoções, o corpo, a alma e a vida dele. Isso se verifica se for dada atenção à fala da mãe. Foram as palavras dela sobre o “Homem da Areia” que abriram as portas da imaginação do menino para a construção do salto que o levou à morte.

Valter Flauzino, 19-03-19.